terça-feira, 23 de junho de 2015

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Prezados,

já passamos por vários desafios até esta próxima etapa da nossa jornada. Posso lembrar como foi difícil chegar ao diagnóstico do quadro de saúde de meus filhos. Foram seis anos, praticamente a vida deles inteira. Mas essa foi uma etapa que ficou para trás, como muitos bem sabem. Após, tivemos o desafio pela frente de encontrar o doador compatível. Na verdade, dois doadores,  pois seria um para Paulinha e outro para Samuel, já que eles não são compatíveis entre si.  Inicialmente,  encontramos o de Samuel. Detalhe: cem por cento compatível e com mesma tipagem sanguínea.

Praticamente um milagre, pois em um universo de 28 milhões de doadores cadastrados, encontramos exatamente um único doador para Samuel. Ficamos felizes, mas precisávamos empreender mais esforços ainda para encontrar o doador de Paulinha. Foi o que fizemos. Nesse momento, os amigos, colegas de trabalho, irmãos de fé e de coração, professores e pais dos coleguinhas de escola dos meninos, todos, inclusive, com a participação de personalidades como os craques do futebol, Daniel Alves e Neymar, a cantora Ivete Sangalo, a apresentadora Carla Pérez e outros tantos, se juntaram a nós numa corrente de solidariedade,  promovendo campanha de doadores de medula óssea. Muitas pessoas generosamente se cadastraram,  abençoando outras tantas que necessitam encontrar um doador compatível.

A TV Bahia nos ajudou com uma reportagem e uma entrevista conosco e, a partir do empenho de tantas pessoas, em especial, da equipe médica de Curititba que não poupou esforços junto aos bancos nacional e mundial de doadores, conseguimos vencer mais esse obstáculo que se apresentava. Pois bem, a boa novidade é que conseguimos um doador noventa por cento compatível para Maria Paula. Novamente, um milagre aconteceu e tudo isso nos fez acreditar que a vida sempre triunfará sobre toda e qualquer adversidade. Tudo isso nos faz crer que o impossível, para os que têm fé em Deus, tem suas possibilidades. Após tudo isso, iniciamos mais uma caminhada, agora aquela em que de uma vez por todas daríamos passos impossíveis de serem refeitos. Essa impossibilidade a que me refiro, essa sim é irrefutável. Seriam passos ousados e desafiadores, porém necessários. Sempre soubemos que o caminho se estreitaria e se afunilaria de tal modo que a passagem seria só de ida e não tinha retorno.

Precisávamos cruzar a Ponte juntamente com nossos filhos e após percorrê-la jamais voltaríamos por ela, pois já estaria detonada por fortes ondas de quimioterapia. Refiro-me à decisão de fazer os transplantes de nossos dois filhos, que,  concomitantemente,  iriam ser submetidos à quimioterapia preparatória para o transplante, o que iria debilitar eles mais ainda e como se sabe sempre há riscos. No caso dos meninos, os riscos eram (são) maiores por causa da imunodeficiência que eles portam e principalmente por já terem vivido por muito tempo em hospital e terem sido alvos de inúmeras infecções. Talvez não suportassem.

Há ainda a difícil decisão de serem apenas o segundo e o terceiro pacientes, de toda América Latina,  portadores da raríssima imunodeficiência por ausência do gene DOCK8. Até o momento só existe um paciente transplantado por esse motivo e,  em todo o mundo, apenas vinte, contando com algumas poucas experiências na Europa e nos EUA. Por tudo isso, precisávamos tomar uma decisão muito difícil, que mudaria a vida dos nossos filhos para sempre. Ao mesmo tempo essa era a nossa única opção e ela exigia de nós coragem, confiança nos médicos, assertividade da decisão e, acima de tudo, fé. Aqui eu peço vênia para dizer que essa fé é aquela que só pode ser projetada em Deus, tendo sido definida pelos apóstolos de Jesus Cristo e pelos pais da Igreja como sendo a certeza das coisas que não se vêem e o firme fundamento dos fatos que se esperam. Foi assim que tomamos a decisão de cruzarmos aquela ponte sobre a qual me referi metaforicamente, que não existe mais, posto que já a percorremos e neste momento nos encontramos do outro lado, na expectativa de que os sonhos convertam-se em realidade e o milagre mais uma vez venha ao nosso encontro, a fim de que possamos contar essa história de amor, fé e esperança, que iniciamos com nossos preciosos, filhos às futuras gerações.

Fiz essa breve narrativa para posicioná-los ao longo da jornada percorrida e ao mesmo tempo dizer a vocês que nada disso seria possível se não fossem suas orações, auxílio, palavras de ânimo e encorajamento. Se esses ingredientes estivessem ausentes nessa nossa peregrinação, certamente os resultados não seriam os mesmos. Além disso, sabemos que este momento pode ser considerado o mais singelo, desafiador e esperançoso de toda a carreira trilhada até aqui. Singelo pois vejo meus filhos no máximo de sua fragilidade. Os efeitos da quimioterapia têm se revelado mais severos, a medula praticamente morta e as defesas de seus organismos zeradas. Não obstante, vejo também suas forças se renovando como as das águias, correndo e não se cansando, caminhando e não se fatigando. É o paradoxo de São Paulo: "o meu poder se aperfeiçoa na sua fraqueza, quando és fraco, então sois fortes". 

Desafiador porque temos ainda estes desafios a superar: as infecções, as mucosites, que são úlceras na boca, esôfago e traquéia, a possível rejeição da medula e a doença do enxerto contra o hospedeiro, que, por vezes, é comum em procedimentos de transplantes de medula óssea. Esperançoso pois esperamos que tudo isso passe e que nossos filhos possam viver uma vida saudável. "A esperança que se vê não é esperança, mas se esperamos o que não vemos, com paciência o aguardamos".  Por fim,  almejamos acima de tudo, humildemente,  que todo percurso trilhado nesta caminhada sirva de estrada para quem porventura tenha que fazer essa mesma ou semelhante travessia. Com amor e profunda gratidão.

Ilton.

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